convite da ação
texto curatorial
Com tijolos e gestos, o MOVIMENTO HO construirá uma paisagem mutável. Durante sete dias, oito horas por dia, Eleonora Fabião, seus colaboradores e quem aqui se puser em movimento – eu e você – vamos atravessar janelas e portas, com o corpo e com o olhar, num exercício de tornar permeável a fronteira entre a rua e a instituição, entre a instituição, o artista e o público.
Despesa de energia, experiência corporal (incluindo a cabeça) que não envolve “nem lucro, nem cura, nem salvação”, como diria a artista. Movimento na direção do outro movido pelo desejo mesmo de fazer pensar coletivamente, pela tentativa de fricção entre arte e vida, coisa e poesia (aquilo mesmo que Hélio Oiticica buscava ao afirmar que “museu é o mundo, é a experiência cotidiana”).
Nas escolhas que desenham o trabalho sentimos a proximidade da artista com a dança (as composições e recomposições dos tijolos são contra-coreografias); no statement e no que a artista chama de “programa”, no trabalho físico pragmático e desmistificado, sua conversa com a performance norte-americana. O espaço é cru, as janelas estão abertas, a luz natural e sua intensidade marcam a passagem do tempo ao longo do dia. Nenhuma parede falsa nem coxias haverá aqui onde nos moveremos, nos deteremos por vezes, conversaremos.
Neste espaço aberto se esboçará talvez entre nós um Movimento (político, porque movente) que se dispersará de repente em detalhes singulares, em gestos ínfimos, em corpos distintos um do outro – e, por isso mesmo, capazes de se transformarem mutuamente.
Izabela Pucu e Tania Rivera
texto da artista
o que move o MOVIMENTO HO?
O MOVIMENTO HO é uma ação concebida por uma performer que trabalha prioritariamente nas ruas. O movimento começa num espaço expositivo tradicional mas age no influxo da tradição disruptiva da arte da performance. Ele começa movimentando um espaço de arte e seus arredores, para então se transformar em material de construção de um espaço de movimento comunitário na cidade—a Casa das Mulheres da Maré.
O MOVIMENTO HO se pergunta e nos pergunta: o que é objeto artístico? Ou antes, o que é objeto? E mais, o que é obra de arte? Ou ainda, o que queremos que arte seja? Ou mais ainda, o que queremos que arte mova?
O MOVIMENTO HO se pergunta e nos pergunta que atos constroem a cidade em que queremos viver, que atos impedem a construção da cidade em que queremos viver e que atos destroem a cidade em que queremos viver?
O MOVIMENTO HO se pergunta e nos pergunta: “o que é uma coisa bela?”
O MOVIMENTO HO começa no primeiro dia útil da semana—na segunda-feira dia 31 de outubro de 2016 imediatamente após a eleição do novo prefeito da cidade—movido por uma “vontade construtiva geral”; é uma ação coletiva que propõe a indissociabilidade entre o ato de construir e a ética da aprendizagem permanente.
O MOVIMENTO HO se chama assim porque acontece no espaço cultural da cidade que homenageia o grande Hélio Oiticica. E faz também homenagem. Pois fato é que para além da obra extraordinária, de cada fase e da trajetória como um todo, Hélio Oiticica fez movimento. Extraordinário movimento de “experimentar o experimental” que reverbera até aqui, até agora, tamanha a potência e a inteligência da coisa toda. Tamanha a energética conceitual, corporal e social da cosmocoisa que segue se desdobrando prismática, política e sensória.
O MOVIMENTO HO é uma jornada de 7 dias; um processo de construção material e imaterial, objetivo e subjetivo, airado e pesado, visível e invisível, geométrico e orgânico, corporal e suarento, poético e político, espacial, mental, espiritual e social.
O MOVIMENTO HO é um espaço de encontro. Além do grupo de 7 pessoas em ação permanente, colaboram todos os que quiserem colaborar.
Ao MOVIMENTO HO interessa desconstruir cuidadosamente a hierarquia entre sujeitos e objetos—posto que os sujeitos, na grande maioria das vezes, são tidos como os senhores absolutos dos objetos e os promotores das ações. Na busca por maior horizontalidade, dinamismo e reciprocidade, o MOVIMENTO HO chama sujeitos e objetos de agentes. Todos os agentes envolvidos—cada qual em sua singularidade e compondo articuladamente a singularidade do conjunto—formam uma teia de relações intra-ativas e se constituem mutuamente.
No MOVIMENTO HO tijolo move gente que move tijolo que move gente que move livro que move tijolo que move tijolo que move gente que move gente que move. Há algo de alguma dança nisso. E quem dança é o espaço.
MOVIMENTO HO é um experimento sobre corpos coletivos.
MOVIMENTO HO é uma disputa explícita por espaços imaginários e simbólicos na arena pública.
MOVIMENTO HO performa aberta, coletiva e corporalmente uma luta em favor de experimentação e de imaginação política.
MOVIMENTO HO é uma meditação sobre abstracionismo e concretude, materialismo e encantamento, ausência de cimento e presença de espírito, agenciamentos singulares e coletivos na cidade do Rio de Janeiro.
MOVIMENTO HO quer todos os encantamentos.
Encantamento: material definitivo e derradeiro.
Eleonora Fabião
Outubro de 2016
imagens da ação
Movimento HO, 2016. Foto: Felipe Ribeiro e André Telles
Movimento HO, 2016. Foto: Felipe Ribeiro e André Telles
Movimento HO, 2016. Foto: Felipe Ribeiro e André Telles
Movimento HO, 2016. Foto: Felipe Ribeiro e André Telles
Movimento HO, 2016. Foto: Felipe Ribeiro e André Telles
Movimento HO, 2016. Foto: Felipe Ribeiro e André Telles
Movimento HO, 2016, tijolos sendo levados para a construção da Casa da Mulher, no Complexo da Maré, Rio de janeiro. Foto: Felipe Ribeiro e André Telles